quarta-feira, 5 de julho de 2017

Não há lei que proíba arbitragem em questões trabalhistas

A Justiça do Trabalho necessita de meios eficazes que possibilitem a diminuição dos conflitos trabalhistas que são judicializados. A adoção do Rito Sumaríssimo acelerou a tramitação de determinados processos além de estabelecer um filtro maior no tocante ao cabimento de recursos de índole extraordinária, contudo, não foi suficiente para reduzir o volume de ações submetidas ao Judiciário Trabalhista.
No mesmo período, no ano de 2000, foram instituídas as Comissões de Conciliação Prévia, na esperança de desafogar este ramo do Poder Judiciário mediante a necessidade de submissão da demanda às comissões de composição paritária. Todavia, a deturpação do funcionamento de alguns destes órgãos e o entendimento jurisprudencial que se consolidou neste período acerca da eficácia liberatória do termo de quitação e a não obrigatoriedade de submissão da demanda estabelecida pelo Supremo Tribunal Federal esvaziaram o instituto.
A utilização da arbitragem como um meio de solução para os conflitos trabalhistas é algo que ainda desperta muita polêmica. Em um primeiro momento é sempre vista com maus olhos pelo Judiciário.
O ministro Mauricio Godinho Delgado[1] entende que a aplicação do instituto da arbitragem deve se restringir a segmentos jurídicos onde haja equivalência de poder entre os sujeitos contrapostos e por esta razão o instituto não seria compatível com o Direito Individual do Trabalho, que regula o contrato laborativo entre empregados e empregadores, cujos princípios estariam em antítese frontal perante o princípio que rege a arbitragem.
Com efeito, a Constituição Federal e a CLT são omissas a respeito da admissão da arbitragem na ação trabalhista individual.
A arbitragem, em tese, não é fato impeditivo de acesso ao Poder Judiciário. Tampouco substitui a atuação desta especializada. Muito pelo contrário! Pode ser um instrumento de auxílio como forma alternativa de solução de conflitos.
A má aplicação do instituto é que deve ser combatida, pois a arbitragem não pode servir como forma de diminuição de direitos trabalhistas, mas sim como instrumento capaz de assegurar o cumprimento da legislação trabalhista de uma forma mais amena.
Estabelece o artigo 9º da Lei 9.307/96 que o compromisso arbitral é a convenção através da qual as partes submetem um litígio à arbitragem de uma ou mais pessoas, razão pela qual o instituto se caracteriza como forma alternativa de prevenção ou solução de conflitos à qual as partes aderem, por manifestação de suas vontades.
Não existe qualquer norma que proíba a adoção da arbitragem na Justiça do Trabalho para a solução de dissídios individuais de trabalho.
Em outubro de 2008, a 7ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) manteve uma decisão arbitral no caso de demissão de um trabalhador por conta do fechamento da empresa. No caso em tela, o empregado teve sua rescisão homologada por juízo arbitral, onde outorgou “ampla e irrevogável quitação” ao extinto contrato de trabalho, para nada mais reclamar contra a empresa.
Em que pese o fato de ter concordado com a sentença, o trabalhador acionou a empresa judicialmente. Porém, o ministro Pedro Paulo Manus, relator do processo, afirmou que a arbitragem representa mais uma forma de acesso à Justiça e que os juízes não podem ser refratários a ela quando verificada a observância dos critérios legais.
Assim constou da ementa do referido julgado. Verbis:
AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. JUÍZO ARBITRAL. COISA JULGADA. LEI Nº 9.307/96. CONSTITUCIONALIDADE. O art. 5º, XXXV, da Constituição Federal dispõe sobre a garantia constitucional da universalidade da jurisdição, a qual, por definir que nenhuma lesão ou ameaça a direito pode ser excluída da apreciação do Poder Judiciário, não se incompatibiliza com o compromisso arbitral e os efeitos de coisa julgada de que trata a Lei nº 9.307/96. É que a arbitragem se caracteriza como forma alternativa de prevenção ou solução de conflitos à qual as partes aderem, por força de suas próprias vontades, e o inciso XXXV do art. 5º da Constituição Federal não impõe o direito à ação como um dever, no sentido de que todo e qualquer litígio deve ser submetido ao Poder Judiciário. Dessa forma, as partes, ao adotarem a arbitragem, tão-só por isso, não praticam ato de lesão ou ameaça à direito. Assim, reconhecido pela Corte Regional que a sentença arbitral foi proferida nos termos da lei e que não há vício na decisão proferida pelo juízo arbitral, não se há de falar em afronta ao mencionado dispositivo constitucional ou em inconstitucionalidade da Lei nº 9.307/96. Despicienda a discussão em torno dos arts. 940 do Código Civil e 477 da CLT ou de que o termo de arbitragem não é válido por falta de juntada de documentos, haja vista que reconhecido pelo Tribunal Regional que a sentença arbitral observou os termos da Lei nº 9.307/96 - a qual não exige a observação daqueles dispositivos legais - e não tratou da necessidade de apresentação de documentos (aplicação das Súmulas nºs 126 e 422 do TST). Os arestos apresentados para confronto de teses são inservíveis, a teor da alínea "a" do artigo 896 da CLT e da Súmula nº 296 desta Corte. Agravo de instrumento a que se nega provimento.
(AIRR - 147500-16.2000.5.05.0193 , Relator Ministro: Pedro Paulo Manus, Data de Julgamento: 15/10/2008, 7ª Turma, Data de Publicação: 17/10/2008)
Portanto, desde que preservados os princípios inerentes ao Direito Individual do Trabalho, pode o instituto da arbitragem ser aplicado também neste ramo do Direito que sempre adotou normas avançadas de solução de conflitos.
Por 

[1] In Revista LTr – Vol. 76, nº 08

sexta-feira, 30 de junho de 2017

FORUM ARBITRAL

Um dos mecanismos existentes para auxiliar na composição dos litígios, contribuindo para a efetividade da jurisdição, é a solução alternativa de conflitos, consistente na conciliação, mediação e arbitragem
Sem sombra de dúvida, o maior desafio do mundo jurídico, atualmente, é a efetividade da prestação jurisdicional, ou seja, a entrega da jurisdição (solução dos litígios pelo poder judiciário) de forma rápida e eficiente. A morosidade da Justiça é tema recorrente entre os operadores do direito, constituindo verdadeiro entrave para o desenvolvimento econômico e social do país.
O esforço para o aprimoramento na prestação jurisdicional é uma constante. Mauro Capelletti e Bryan Garth (Acesso à Justiça. Tradução Ellen Gracie Northfleet. Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris Editor, 1988), precursores do movimento denominado ondas renovatórias, identificaram uma concentração de forças na (i) melhoria da assistência judiciária (acesso à Justiça), (ii) na proteção dos direitos difusos e coletivos e (iii) na efetividade da jurisdição. Em rigor, somente a efetividade da prestação jurisdicional ainda caminha a passos lentos. Inversamente, alterações legislativas – além do fortalecimento da Defensoria Pública e do Ministério Público – garantiram sensíveis avanços ao acesso à Justiça e à proteção dos direitos difusos e coletivos.
Portanto, a efetividade é o nó górdio da prestação jurisdicional. Um dos mecanismos existentes para auxiliar na composição dos litígios, contribuindo para a efetividade da jurisdição, é a solução alternativa de conflitos, consistente na conciliação, mediação e arbitragem.
A solução alternativa de conflitos, por intermédio da conciliação, mediação e arbitragem, não é nenhuma novidade, positivando-se inicialmente no direito brasileiro por meio da Constituição Política do Império do Brasil, de 1824, que, em seu art. 160, dispunha que nas causas cíveis, e nas penais civilmente intentadas, poderiam as partes nomear juízes árbitros.
O CC de 1916 e os CPC de 1939 e de 1973 também trataram da arbitragem, como forma alternativa de solução de conflitos. Posteriormente, representando um grande avanço legislativo, adveio a lei 9.307/96, que dispõe, em seu art. 1º, que as pessoas capazes de contratar poderão valer-se da arbitragem para dirimir litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis.
Passadas quase duas décadas, a lei 9.307/96 não correspondia mais às novas demandas e necessidades da sociedade, de forma que foi editada a lei 13.129/15, elaborada por um seleto grupo de juristas, coordenados pelo ministro Luis Felipe Salomão (STJ).
As novidades, consolidando, basicamente, a jurisprudência do STJ, foram: (i) utilização da arbitragem pela administração pública, (ii) sentenças arbitrais parciais, (iii) redução de hipóteses de nulidade de sentença arbitral, (iv) utilização de tutela de urgência antes da constituição do juízo arbitral, (v) criação da carta arbitral, (vi) retirada de acionista minoritário que discordar de inclusão de cláusula compromissária no estatuto social, (vii) possibilidade das partes olvidarem dispositivo do juízo arbitral que limite a escolha de árbitro e (viii) previsão de interrupção da prescrição pela arbitragem.
Por sua vez, o Novo CPC consagrou a conciliação, mediação e arbitragem – além de outros métodos de solução consensual de conflitos – em seu art. 3º, §§ 1º e 3º, dando uma nova conotação ao instituto da arbitragem, conferindo-lhe atributos próprios de jurisdição, em convivência harmônica com a tutela jurisdicional propriamente dita. Essa convivência harmônica entre a arbitragem e a jurisdição se verifica por meio do instituto da Carta Arbitral, nos termos do art. 237, IV, do Novo CPC (v. também arts. 189, IV, 260, § 3º, 261 a 263 e 267).
O Novo Código de Ética e Disciplina da OAB (Novo CED), instituído pela resolução CFOAB n. 2/15 (DOU 4/11/15), em vigor desde 1/09/16, preconizou como dever da advogada e do advogado estimular, a qualquer tempo, a conciliação e a mediação entre os litigantes, prevenindo, sempre que possível, a instauração de litígios.
O Novo CED garantiu à advogada e ao advogado a contratação de honorários profissionais, nas mesmas condições, na mediação, na conciliação, na arbitragem ou a qualquer outro método adequado de solução dos conflitos (art. 48, § 4º), estimulando, dessa forma, a resolução alternativa de conflitos.
Por fim, o Novo CED atribuiu aos Tribunais de Ética e Disciplina (TED) atuarem como órgãos mediadores ou conciliadores nas questões que envolvam: (i) dúvidas e pendências entre advogados, (ii) partilha de honorários contratados em conjunto ou decorrentes de substabelecimento, bem como os que resultem de sucumbência, nas mesmas hipóteses e (iii) controvérsias surgidas quando da dissolução de sociedade de advogados.
A morosidade da Justiça é um problema universal e o modelo clássico de solução de conflitos (por meio da jurisdição) possui altíssimo custo para o Estado, de forma que a solução alternativa de conflitos, por intermédio da conciliação, mediação e arbitragem, constitui importante ferramenta para desafogar o poder judiciário, contribuindo para a pacificação social e o desenvolvimento econômico. Segundo o ministro Luis Roberto Barroso (STF), "o advogado do futuro não é aquele que propõe uma boa demanda, mas aquele que a evita" (palestra proferida no dia 11/8/16, dia do advogado, no 7º Congresso Brasileiro de Sociedades de Advogados).

*Marco Aurélio de Oliveira Rocha é advogado e secretário-Geral da OAB/MS - Ordem dos Advogados do Brasil, Seção Mato Grosso do Sul.